O mercado de café, que é o principal produto agrícola do Espírito Santo, está vivendo uma verdadeira revolução. Depois da Operação Broca – que prendeu, há quase um mês, dezenas de pessoas de empresas comercializadoras do produto por um suposto esquema de sonegação de impostos –, as cooperativas de café estão sendo a grande salvação para os produtores armazenarem e venderem sua produção. Assustados com a constatação da fraude, que envolvia centenas de empresas “laranja”, e preocupados com a possibilidade de prejuízos, os cafeicultores estão apostando na credibilidade do cooperativismo.
A prova dessa mudança é a grande procura dos produtores pelas cooperativas para oficializar a associação ou para comercializar o café. Na Cooperativa Centro-Serrana (Coopeavi), de Santa Maria de Jetibá, por exemplo, foi registrado um aumento de 30% no quadro de associados neste mês, explica o gerente de Operação de Mercado de Café, João Elvídio Galimberti.
E a movimentação dos produtores em direção à cooperativa tem uma justificativa clara: “A dificuldade em comercializar a produção e a insegurança em vender para quem não tem credibilidade e representa risco de prejuízo”, destaca Galimberti. Ele conta que os produtores estão receosos de também serem envolvidos, de alguma forma, nas operações comerciais consideradas ilícitas.
Hoje, conta o gerente da Coopeavi, muitos produtores, que antes não se preocupavam em confirmar a idoneiade das empresas/corretoras para as quais vendiam o café, estão se cercando de cuidados para evitar problemas futuros e prejuízos com a possibilidade de não receberem o pagamento das vendas já efetuadas.
O esquema de sonegação, desvendado com as investigações desencadeadas pela Operação Broca, “trouxe clareza ao mercado, e hoje os produtores sabem do que se trata”, enfatiza o gerente executivo administrativo e financeiro da Coopeavi, Marcelino Bellardt. Ele conta que alguns produtores, inclusive cooperados, que vendiam o café a outras empresas, foram chamados a prestar esclarecimentos à Receita Federal, em 2005.
A Receita queria saber porque havia depósitos em suas contas sem o registro da venda no bloco de notas. Depois, esses produtores ficaram sabendo que seus blocos de notas foram usados para registrar vendas de café em nome de outros produtores. “Não basta ser cooperado. Tem que ser cooperado e ter o bloco de notas com uso correto”, alerta Galimberti.
Outro problema enfrentado pelos produtores que entregavam o café às empresas fictícias é a falta de pagamento. Como essas empresas que não recolhem os tributos oferecem um preço mais competitivo – muitas vezes até acima da cotação de mercado–, há risco de os produtores não verem a cor do dinheiro. “Todo ano tem gente que leva tombo e perde muito. É difícil se reerguer”, lembra Galimberti.
Além de reforçar o quadro de associados, a Coopeavi se prepara para começar a exportar café ainda neste ano. A instituição, já regularizada para vender ao exterior, estuda o mercado e deve fazer os primeiros embarques para a Argentina e para o Oriente Médio no segundo semestre. Primeiro será o café arábica e, depois, o conilon também entrará nas exportações.
Produtor busca confiança e credibilidade
Um dos fatores que contribuíram para aumentar a procura dos produtores pelas cooperativas foi o resultado da Operação Broca, desencadeada pela Receita Federal, pelo Ministério Público Federal e pela Polícia Federal, e que apontou esquema de vantagens tributárias ilegais.
A operação foi divulgada faz cerca de 30 dias e envolveu corretoras, torrefadoras e exportadoras. “Os produtores viram que as cooperativas são confiáveis e se tornaram a melhor opção para comercializar a produção de café”, destaca superintendente da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB-ES), Carlos André Santos de Oliveira.
As cooperativas, destacou, sempre trabalharam contra “essas armadilhas e contra as empresas ‘laranja’”. Agora, explica, as cooperativas estão no mercado em pé de igualdade, porque a operação amenizou a concorrência desleal e o produtor rural está vendo as cooperativas como instituições confiáveis. O produtor, lembra Oliveira, está procurando as cooperativas para se tornar associado e também para vender sua produção.
A busca dos produtores pelas cooperativas aumentou porque “saíram do mercado as empresas ‘laranja’ que pagavam mais do que as cooperativas. Só que os produtores não sabiam que o valor de R$ 3 a R$ 5 a mais que pagavam por saca era o dinheiro do imposto que elas não recolhiam”, destaca o presidente da OCB-ES.
O aumento do quadro de associados fez a OCB-ES mudar seu planejamento e antecipar a implementação de projetos que estavam em estudos. A OCB, em parceria com o Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo (Sescoop-ES), contratou projeto de consultoria para a comercialização de parte do café dos 6.360 associados das 11 cooperativas de café no Estado.
O projeto, que deverá estar concretizado até meados de 2011, prevê a criação de uma marca própria do café que será industrializado e comercializado pelas cooperativas. Serão criadas marcas de conilon e de arábica para a categoria popular e também de arábica e conilon de cafés especiais.
Uma das vantagens da industrialização do café é a agregação de valor ao produto. Outra proposta em estudo é a exportação direta, que será feita pelas próprias cooperativas.
Cooperativa alerta para armadilhas
Com o intuito de esclarecer os associados a respeito do mercado de café, o jornal informativo da Coopeavi, que começa a ser distribuído nesta semana, traz matéria de capa que enfoca o mercado de café. No texto, as explicações e as orientações para que os cooperados não corram riscos ao vender o café que produzem e também para que não caiam nas armadilhas montadas pelas empresas que buscam aumentar o lucro por meio da sonegação de tributos.
“Vamos ter sócios de todo o Estado”
A maior cooperativa de café conilon do mundo, que tem 1.800 associados do Norte e Noroeste capixaba e do Sul da Bahia, além de dez galpões de armazenagem, também registrou aumento na movimentação. Uma média de 30 produtores procura, diariamente, a instituição com o objetivo de fazer parte de seus quadros. “Se continuar como está, vamos ter sócios de todo o Estado”, comenta o presidente da Cooperativa Agrária dos Cafeicultores de São Gabriel (Cooabriel), Antônio Joaquim de Souza Neto.
O crescimento do quadro de associados leva a diretoria da cooperativa a planejar a construção de novos armazéns, dobrando a capacidade de armazenagem, que hoje é de 500 mil sacas de café. Além de atender aos novos sócios no Espírito Santo, a Cooabriel vai construir galpões de estocagem na Bahia.
As lavouras de cacau nas regiões de Eunápolis e Itabela, dizimadas pela vassoura-de-bruxa (uma praga que ataca e mata os pés de cacau), estão sendo substituídas pelo café conilon. Nessa região, explica Souza, os produtores empresariais são maioria. Ou seja, são grandes produtores, diferentemente do Espírito Santo, onde a maioria das lavouras são de médios e pequenos produtores.
Muitos dos que hoje procuram a cooperativa já pertenciam aos seus quadros, mas não estavam fazendo negócios com a instituição. Nas últimas semanas, entretanto, esses associados que vendiam sua produção a outras empresas retomaram a venda da produção de café para a cooperativa, explica Souza. No mês passado, a Cooabriel comercializou 34.570 sacas de café contra 33.100 sacas em maio de 2009.
A instituição que compra e armazena café apenas de seus associados vende o produto para grandes torrefadoras de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e do Nordeste. Com a venda de grande volume, a cooperativa ganha poder de negociação e consegue melhor preço. Uma remuneração bem melhor que a do pequeno produtor, que, com pouco volume, não tem poder de negociação.
Cooperativas
Cooabriel
Cooperativa Agrária dos Cafeicultores de São Gabriel
Sede: São Gabriel da Palha, na Região Norte do Estado.
Fundação: 1963.
Associados: 1.800, todos produtores de café conilon.
Armazéns: 10
Capacidade: 500 mil sacas de café.
Atuação: armazenagem e comercialização de café conilon, financia adubos e defensivos e fornece assistência técnica.
Coopeavi
Cooperativa Agropecuária Centro-Serrana
Sede: Santa Maria de Jetibá, na Região Centro-Serrana do Estado.
Fundação: 1964.
Associados: 4.850, a maioria, cerca de 80% são produtores de café. Desses 50% produzem café arábica e 50%, café conilon.
Armazéns: 2
Capacidade: 120 mil sacas de café.
Atuação: armazenagem e comercialização de café arábica e conilon, avicultura, produção de ração e produtos agropecuários. Financia adubo, irrigação e fornece assistência técnica.
Fonte: Jornal A Gazeta - 27/06/10