Nos últimos 20 anos, a qualidade do café brasileiro melhorou significativamente. A disseminação de boas práticas, na colheita e na secagem, é o principal componente desse resultado.
Mudanças nas práticas dos produtores, porém, não ocorrem de uma hora para outra. Ainda que a demanda sinalize uma preferência por maior qualidade, não é fácil para o cafeicultor identificar e apostar nessa mudança.
Em primeiro lugar, porque isso acarreta mais trabalho e a incerteza de ganhos futuros. Além disso, o poderoso incentivo fornecido pelos preços é frequentemente capturado pelos elos intermediários da cadeia.
O que explica o progressivo investimento em qualidade do produto? Existe algum modelo que nos forneça lições?
Para entender a nova realidade, é necessário voltar ao início da década de 90, época da pior queda de preços desde a crise dos anos 1930.
Em meio a uma difícil situação no mercado, muitos cafeicultores se viram estimulados a correr riscos, entrando em um novo nicho de mercado. A maior demanda por cafés especiais nos países do hemisfério Norte foi a oportunidade para o início da transformação.
A década de 90 foi também a época do ressurgimento do interesse pelo potencial do café brasileiro. A desregulamentação do mercado internacional, aliada ao interesse das empresas de café especial em garantir o suprimento de matéria-prima de qualidade, resultou em uma reestruturação do relacionamento entre parte dos cafeicultores e a iniciativa privada.
Mais especificamente, o que se viu foi a aproximação entre a iniciativa privada e esses produtores em um esforço real de entendimento das condições que garantiriam a qualidade exigida pelo mercado. Treinamentos específicos forneceram as ferramentas necessárias para a gestão do negócio, aproximando também os órgãos de pesquisa especializados.
Desde então, esse movimento ganhou corpo, sendo liderado pela ação de uma torrefadora italiana. A disseminação dos concursos de qualidade pelo país, ao recompensar as boas práticas, teve importante efeito didático sobre os cafeicultores.
O êxito desse modelo se deve à natureza da parceria estabelecida pela iniciativa privada, pautada pelo diálogo constante com os cafeicultores.
Da mesma forma, a aproximação dos órgãos de pesquisa do cotidiano da atividade reforça, entre os produtores, a necessidade de aplicação do conhecimento técnico para a obtenção de melhores resultados.
Assim, é importante salientar a centralidade dos produtores para o bom funcionamento da cadeia. Maior atenção aos seus anseios, nesse sentido, deve acarretar políticas consistentes, e não apenas ações de marketing.
A identificação das preferências do consumidor, em um modelo que valoriza o conhecimento científico, é fundamental. Mais importante é estabelecer um modelo de relacionamento entre os agentes que possa se sustentar no longo prazo.
A "asfixia" do segmento produtor, na busca por maiores lucros, ou a adoção de modelos utópicos de gestão somente contribui para disseminar a insatisfação, o que, na prática, significa menores incentivos para a diferenciação. Compartilhar valor deve ser uma estratégia real e não só de marketing.
Fonte: Café Point
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